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(A Helping Hand, de Émile Renouf) |
"A vida não é de se brincar porque em pleno dia se morre"
(Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres - Clarice Lispector)
Talvez com uma ênfase maior que os demais
filósofos, Aristóteles preocupou-se em responder o que é o bem humano. Dessa
forma, o grego influenciou muitos pensadores e ainda hoje é objetivo
de interesse reflexivo sobre um tema caro à nossa sociedade: a felicidade
humana.
Tomando um exemplo motivacional, a seguinte
situação prática é proposta: Um nadador amador, mas com capacidade suficiente
para reconhecer locais perigosos, presencia um indivíduo em afogamento. No
caso, nosso nadador é o agente moral e salvar a pessoa é o fim desejado.
Considerando sua experiência prática, ele reconhece que tem condições de ajudar
a pessoa em apuros. Duas situações podem acontecer:
Agente moral (i) - No
momento em que o andador chegava para socorrer, um tronco de árvore que passava no
interior do rio atingiu a pessoa em afogamento; eventualmente, ela acabou
morrendo.
Agente moral (ii) - O
nadador conseguiu salvar com êxito o indivíduo que se afogava.
Dentro do contexto aristotélico, pode-se perguntar
o seguinte: Os dois agentes morais são virtuosos? Quais dos dois é mais
virtuoso? Algum dos agentes é mais feliz que o outro? Qual a relação entre
felicidade e virtude?
Aristóteles reconhecia a experiência humana como
ponto de partida. Afim de entender com mais detalhes o que está inserido no
contexto de "vida humana" faz-se necessário explorar um pouco o que o
grego entendia como vida prática. Em "Ética a Nicômaco", Aristóteles
começa ressaltando que as nossas ações se dão de modo dependente uma das
outras, ou seja, fazemos coisas (escolhas, buscas ou ações) que visam a algum
bem. E, mais do que isso, há um bem
último ao qual todas as coisas visam:
"Toda a arte e toda a investigação, e
similarmente toda a ação e escolha, parecem visar um qualquer bem; de acordo
com isto, declarou-se corretamente que o bem é aquilo que todas as coisas
visam." (Ética a Nicômaco 1094a 1-3)
Importante destacar que para Aristóteles há uma
convertibilidade entre bem e fim -- ou seja, a concepção do bem é teleológica. Dito
de outro modo, para o ser humano alcançar o que é bom para ele, precisa tomar o
bom como uma finalidade. Isso é particularmente relevante na ética
aristotélica, pois reconhecer algo como bom não implica tomar algo para si como
bom. Vale destacar, novamente, que toda escolha visa um bem. Dito isso,
Aristóteles divide o bem (o fim) em instrumental e intrínseco. O primeiro
caracteriza-se como algo que busco em função daquilo que posso alcançar com
essa através dele (exemplo: dinheiro), e o segundo eu busco por ele mesmo, ou
seja, tem valor por si (exemplo: conhecimento). Entretanto, um bem ser
intrínseco não impede que também seja instrumental. Consequentemente,
Aristóteles defende a existência de um fim "finalíssimo" -- aquele
que nunca é desejável em vista de outros fins --, que é precisamente aquela
finalidade a qual atende a dois critérios, a saber: i) completude e ii)
autossuficiência. O primeiro diz respeito a coisas que mereçam ser buscadas por
elas mesmas, enquanto que a segunda é aquilo que quando isolado torna a vida
desejável e carente de nada. Dito dessa forma, o critério ii) segue-se
necessariamente de i).
Aristóteles identifica a felicidade (“eudaimonia”)
como o único bem que pode ser completo e autossuficiente. Em outras, a felicidade
(embora esse termo seja um pouco problemático enquanto tradução de “eudaimonia”)
é o bem supremo. Nesse contexto, a virtude é uma condição necessária, mas não
suficiente no intento de atingir o bem maior.
Outro ponto de esclarecimento acerca da natureza
da felicidade merece destaque. Aristóteles nega a equivalência de felicidade
com dinheiro, honra e/ou prazer físico. Disso não se segue que tais elementos
não são importantes, apenas não devem ser a razão principal pela qual nossas
ações são direcionadas. Dessa maneira, o que é realmente bom para o ser humano
é determinado por aquilo que os seres humanos são por natureza (Shields, C.).
Um bom ser humano é aquele que executa bem a função humana. E essa função é
estruturada na noção teleológica que Aristóteles assume.
“Dizer que a felicidade é o bem mais elevado
talvez pareça uma trivialidade e o que se quer é uma expressão muito mais clara
do que é tal coisa. Talvez isto surja caso se identifique a função (ergon) de um ser humano. Pois tal como o
bem, e o bom sucesso, de um flautista, de uma estátua e de todo o tipo de
profissão — e, em geral, de seja o que for que tenha uma função e uma ação
característica — parece depender da função, o mesmo parece verdade no que
respeita ao ser humano, se de facto um ser humano tiver uma função.” (Ética a
Nicômaco 1097b 22-1098a 4)
De
maneira sucinta, o argumento da função toma como premissa que a atividade
característica dos seres humanos é o raciocínio. O objetivo é tornar mais claro
o que é o bem humano. Como já dito, Aristóteles defendia uma noção teleológica,
e, nesse caso, as coisas têm, em geral, uma função. Assim, o bom exercício
dessa função está relacionado ao sucesso do ser do qual ela é função. Fazer
algo bem é equivalente a fazer isso de acordo com a excelência própria da
atividade (Lawrence, G.). Destarte, a vida humana deve ser algum tipo de vida
ativa constituída de razão, pois essa é algo próprio e exclusivo ao ser
humano.Vale lembrar, portanto, a definição canônica do bem humano (Ética a
Nicômaco 1098a 161-17):
“O bem humano é uma atividade da alma(1)
que exprime a razão de um modo virtuoso.”
A metafísica aristotélica defende que a virtude
moral é a perfeição da parte desiderativa da alma2. Essa observação,
embora relevante, pode ser melhor entendida se nos deteremos um pouco mais na
virtude moral. Esta é em vista da eudaimonia – ou seja, a virtude é consequência das ações, e não o objetivo3,
no sentido de que ser virtuoso é condicionada à eudaimonia. O objetivo é a
eudaimonia. Assim, devemos enfatizar que ser virtuoso não é condição suficiente
para ser feliz; naturalmente há fatores externos, tais como amigos, beleza, uma
condição financeira satisfatória, etc. Ser virtuoso é uma prática que leva a um
hábito, ou a uma capacidade de desejar ações boas. Parte disso explica a
atenção de Aristóteles no educador moral. A presença deste seria uma condição
facilitadora para tornar o indivíduo virtuoso.
Uma vez entendido que o bem do humano é a
atividade racional segundo a virtude, é útil, nesse ponto, trazer à tona o
conceito de deliberação e como este se relaciona com a felicidade. Deliberar
pode ser entendida como um processo racional que considera alternativas em
vista de um fim factível (realizável). Ou, ainda, deliberar é um processo
racional em vista de um fim. Assim, lembremos a tese aristotélica: "Deliberamos não sobre os fins, mas apenas
sobre os meios." Nesse sentido, a felicidade é a única coisa que nunca
pode ser meio – ou seja, não deliberamos sobre sermos felizes (uma maneira
branda de entender isso é que todos os indivíduos querem ser felizes).
Entretanto, deve ficar claro que deliberamos, sim, sobre os atos que compõe a
felicidade. Dessa forma, embora não entremos em detalhes, é relevante pontuar
que a deliberação é consequência daquilo que Aristóteles chamava de razão
prática. Mais ainda, sendo a eudaimonia aquilo o que é bom para o ser humano,
aquele que melhor determina isso é o sábio prático.
A sabedoria prática seria uma espécie de guia para
que o indivíduo identificasse o bem maior de maneira correta. Desse modo, a
incapacidade de organizar e planejar a vida para alcançar um único fim se deve
a ausência da sabedoria prática; escolher fins ruins, ou inadequados (como
prazer ou dinheiro), também revela alguma deficiência dessa sabedoria. Grosso
modo, o sábio prático é capaz de
identificar os melhores meios que conduzem a um bom fim (deliberação).
Nas palavras de Ackrill, a virtude moral (a
excelência do caráter) é uma mediana
determinada pelo padrão seguindo aquilo que o sábio prático empregaria. Essa
observação fica mais clara ao recordarmos a importante tese defendida por
Aristóteles: a sabedoria prática implica
necessariamente virtude moral, e vice-versa. Embora já tenha sido
apresentado indicativos, é relevante destacar que uma não é a mesma coisa que a
outra (identidade). É nesse sentido, também, que Aristóteles enfatiza o aspecto
prático da aquisição das virtudes morais. A questão é que não há como tornar-se
virtuoso moral sem, ao mesmo tempo, adquirir sabedoria prática. Além disso, a
sagacidade é uma condição necessária para a sabedoria prática: Ela (sagacidade)
é tida como a habilidade de colocar em prática escolhas deliberadas, como: o
desejo reto (o fim que é bom) e o raciocínio correto (as coisas em vista de um
fim, ou seja, a prudência). Colocando de outra forma, embora a virtude moral
seja distinta da prudência, ambas coexistem -- uma não existe, necessariamente,
sem a outra.
Embora Aristóteles afirme que a boa ação é a
melhor vida para o ser humano, também afirma que a atividade meramente
contemplativa é a que se identifica melhor com a eudaimonia. Antes de abordar
esse aspecto conflitante, exploraremos um pouco mais o papel da
contemplação.
Para Aristóteles, a sabedoria filosófica é a mais
digna de ser buscada -- ela é o estado saudável da alma teórica (theôria). Desse modo, a virtude da alma
contemplativa (sophia) é tida como o
que Aristóteles indica ser a felicidade perfeita. Ainda, parece que sabedoria
filosófica "produz" sabedoria filosófica, no sentido de proporcionar
o seu vir a ser, ou pelo menos fornecer meios para isso acontecer. Portanto, a
atividade que mais se identifica com a felicidade é contemplação. Sucintamente,
algumas razões podem ser defendias nesse sentido: i) natureza do objeto, pois
diz respeito a objetos eternos, duráveis e universais; ii) é a mais contínua -
no sentido de que cansa menos e é a mais prazerosa; iii) é a atividade mais
auto-suficiente e iv) é aquilo que há de melhor em nós (não no sentido moral).
Podemos agora explorar melhor o problema: A
virtude implica sabedoria prática, e esta serve de meio instrumental para a sabedoria
filosófica, e, por fim, esta gera felicidade. Tendo em vista esse raciocínio, a
consequência é que os valores das ações morais significaria que são
dispensáveis quando não produzem sabedoria filosófica. Outra forma de colocar o
problema é com a seguinte pergunta: Como, se é possível, conciliar teórica ou
conceitualmente as exigências da vida prática e da vida contemplativa? Adianto
que defenderei uma tese conciliadora, e portanto será necessário revisar alguns
pontos acerca da eudaimonia, vida prática e teórica. Em suma, parece que
identificar esse problema não parece condizer com o projeto moral defendido por
Aristóteles, no sentido de ignorar a natureza não apenas das virtudes mas
também da eudaimonia.
A primeira observação necessária pode ser
encontrada em Ackrill, que defende o seguinte: Ações morais visam promover ou
tornar possível a contemplação -- as virtudes morais são facilitadoras para a
obtenção da sabedoria prática, e, portanto, a contemplação. Disso dito, não se
segue que i) não é possível ser feliz na ausência da contemplação e ii) só é
possível ser feliz se o indivíduo for um sábio prático. Disso se segue que
Aristóteles parece indicar que a felicidade produzida pela sabedoria filosófica
difere da felicidade produzida pela sabedoria prática. Além disso, o sábio
prático é aquele que delibera bem; portanto, parece pouco plausível que a
felicidade fosse impedida para o sábio prático. Dito dessa forma, podemos
conciliar com o que Aristóteles comenta sobre graus diferentes de felicidade:
“A segunda
vida mais feliz é a que está de acordo com o outro gênero de virtude; pois as
atividades deste gênero são humanas. Pois fazemos apenas coisas justas e
corajosas e os outros tipos de coisas de acordo com este género de virtude em
relação uns aos outros […] e todas parecem humanas.” (Ética a Nicómaco
1178a 9-14)
Conforme discutido por Shields, “a felicidade admite graus, sendo a melhor
felicidade a contemplação, mas a segunda melhor felicidade, que é à mesma genuína,
é o gênero de felicidade que abrange todas as formas de virtude humana, tanto
intelectuais quanto morais.” Ao entendermos essa espécie de graus de
felicidade, não estamos apenas mostrando elementos textuais que defendem a tese
conciliadora, mas também está em causa, embora discutível, o seguinte: Trata-se de adotar uma perspectiva de doutrina inclusiva da eudaimonia.
É útil entender "fim inclusivo" de acordo como o observado por
Ackrill: algum fim que combine ou inclua dois ou mais valores, atividades ou
bens; ou, ainda, como um fim no qual, dentre seus diferentes componentes nenhum
membro é consideravelmente mais digno de valor do que outro. Embora a tradução
de eudaimonia para felicidade seja imprecisa, o que estamos colocando aqui é grosseiramente entendido que a felicidade é
um estado inclusivo composto de bens independentes. Assim, é necessário
abandonar a ideia restrita que identifica eudaimonia como
"felicidade" ou "prazer", e sim a entender como "a
melhor vida possível", onde "melhor" não sugere,
necessariamente, um sentido moral estrito (Ackrill, JL). Além disso, a alegação
de que existe algum fim desejado em
vista dele mesmo não pressupõe, como comenta Ackrill, que existe "um único
objeto de desejo", como se o fim fosse algo "monolítico"; aliás,
as referências que defendem a arte política como arquitetônica sugerem uma
concepção inclusiva da eudaimonia. Destarte, não significa que a eudaimonia
seja sinônimo de fim último no sentido de desejar um fim único em detrimento de
outros. Resumidamente, a eudaimonia é
composta por partes, ela não é dominante.
A defesa da ideia de um fim que inclua todos os
demais fins desejados independentemente, ou seja, um fim inclusivo que engloba
uma pluralidade de fins separados e subordinados a um fim mais elevado pode ser
melhor ilustrada por um exemplo. Não parece ser insensato afirmar que podem
existir vários graus de finalidades mesmo nos fins desejados por si mesmos: F1
pode ser algo buscado por si mesmo, e
assim também é F2; e considerando F1 mais final que F2, nada impede que F2 contribua
como constituinte de F1. Tomando o exemplo de Ackrill: o prazer pode ser tido
como intrinsecamente digno de escolha (um fim em si mesmo), sendo um elemento
da Eudaimonia. Esta inclui todas as atividades intrinsecamente dignas de
escolhas. É aceitável a tese de que Aristóteles aponta a eudaimonia como sendo
uma atividade que visa uma harmonia entre os diversos fins humanos, ou seja, a
realização e harmonização de fins primários (aqueles fins em vista dos quais
todas as outras coisas são feitas) num todo coerente (Zingano, MA). Em certo
sentido, é isso que significa entender o fim supremo como ser inclusivo em
detrimento de dominante.
Por outro lado, poder-se-ia objetar que a ideia do
bem inclusivo sofreria problemas em
afirmações como "o bem para o homem vem a ser a atividade da alma segundo
a virtude, e, se existir mais de uma virtude, segundo a melhor e a mais
completa" (sophia, a virtude da
razão teórica). Entretanto, pode-se entender "virtude completa" o
conjunto de todas as virtudes. Como defendido por Ackrill, a conclusão do
argumento da função faz referência à virtude completa, e não a alguma virtude
particular.
Uma consequência disso é sobre a relação da sophia com a sabedoria prática. A última
não controla a primeira, mas a torna possível. Disso não segue que a única
coisa possível da sabedoria prática seja promover a theôria. Em outras palavras, Aristóteles
não parece estar assumindo que se determinada ação não promove a theôria, então ela não será digna de ser
buscada. Ainda assim, defende que a theôria
é a atividade mais digna. O que parece estar em causa é o seguinte: Devemos
exercer tanto quanto possível a theôria.
Assim, outras atividades podem ser exercidas quando a contemplação não pode ser
exercida, pois essas outras também são dignas de serem buscadas. A felicidade, portanto, não é negada na
ausência da atividade contemplativa, mas ela é, sem dúvida, uma felicidade
maior quando na presença dessa atividade. De qualquer forma, parece que
dever haver um compromisso entre ações virtuosas com a theôria. Além disso, a vida apenas de theôria não parece ser uma vida feliz. Enfim, o valor da
contemplação não significa que esta seja o provedor de um critério único e
último para a correção das ações.
Tomando tudo o que já foi dito, a tese
conciliadora pode ser resumida: a
sabedoria prática proporciona tempo livre para exercer a sabedoria filosófica.
Mesmo que a contemplação seja a atividade mais auto-suficiente, isso não parece
implicar que o filósofo é mais auto-suficiente que o virtuoso moral. Uma razão
disso é que se identificarmos as condições externas para tornar possível
exercer uma atividade, o filósofo é o que requer condições mínimas para isso.
Em outras palavras, o filósofo precisa de menos instrumentos e pessoas que o
agente moral. Do ponto de vista da eudaimonia, concluímos o seguinte: Já que
não deliberamos sobre sobre os fins, mas sobre os meios, e a felicidade é a
única coisa sobre a qual não deliberamos, segue-se disso que um determinado fim
poderá independer de minhas ações.
Tendo em vista o exposto, é possível resumir os
questinamentos no início do texto da seguinte forma: Supondo que o agente moral obteve uma deliberação correta -- ou seja, a
melhor possível enquanto ser humano --, mas não atingiu o fim desejado (agente
moral i), ele não será menos virtuoso caso tivesse atingindo esse mesmo fim
(agente moral ii). Dito dessa forma,
no contexto do projeto ético aristotélico, será mais feliz o agente moral ii.
Vale salientar, por fim, que atos virtuosos
não são escolhidos porque se é filósofo, mas porque se é humano. Dessa forma, a
felicidade não é negada para aquele que não contempla, muito embora, conforme
já dito, a ausência da contemplação implique o que Aristóteles sugere de
felicidade segunda.
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1.
A noção de alma aristotélica não é a ideia geral
que se assemelha a algo como um espírito. A metafísica aristotélica fazia uma distinção
entre potência e ato. E ainda, de ato primário (e potência primária) e ato secundário (e potência secundária). Exemplo: Embora eu não fale, eu tenho a
possibilidade de adquirir conhecimentos da língua francesa, ou seja é uma potência
primária; quando eu começo a estudar estou desenvolvendo a potência segunda; e
quando estiver falando mais ou menos fluente isso se caracteriza um ato
(colocar em atividade aquilo que é possível). Nesse sentido, a alma é uma
potência primária: torna algo (ser vivo) que terá capacidade de realizar atos
secundário (operações vitais), e que não necessariamente devem acontecer.
Portanto, não é algo tangível. O conhecimento em francês também não é um objeto
tangível, mas não é, por isso, algo fantasmagórico. Aristóteles reconhece que
todos os seres vivos têm alma, mas supõe haver uma hierarquia entre os seres
vivos, começando com as plantas, que têm apenas nutrição, passando pelos
animais não-humanos, que acrescentam a percepção à nutrição, e acabando nos
seres humanos, que são também racionais.
2.
Grosso modo, a alma dos seres humanos é dividida
em irracional e racional. A primeira ainda é composta de uma parte vegetativa
(nutrição, crescimento e reprodução) e outra desiderativa (desejos, apetites e
impulsos) e a segunda composta de uma parte prática e outra teórica. As virtudes
do caráter (morais) derivam da alma desiderativa e virtudes do intelecto
derivam da alma racional. Há uma comunicação entre a alma desiderativa e a
racional, à medida em que a parte desiderativa "dá ouvido" à razão e
nela "respinga" -- mas só na parte prática que compõe a alma
racional.
3.
Interessante notar que a tese normativa moral
aristotélica, bem como outras, sugerem recomendações distintas dos comportamentos que de fato acontecem. No caso em questão, tem sido evidenciado que as pessoas, ao
fazerem escolhas, julgam o resultado das ações não pelo seu valor absoluto mas
se o resultado envolve ganhos ou perdas comparado a um ponto de referência, e
que essas pessoas pesam mais as possíveis perdas do que os eventuais ganhos (para mais informações ver os artigos "Prospect Theory" e "Rational Choice and the Framing of Decisions", de Daniel Kahneman e Amos Tversky).
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Referências
Aristóteles, Ética a Nicômaco
Lawrence,
G. O bem humano e a função humana.
Shields,
C. Aristotle
Ackrill,
J.L. Sobre a Eudaimonia
Zingano,
M.A. Eudaimonia e o bem supremo em Aristóteles