terça-feira, 20 de agosto de 2019

Educação, os pós-modernos e o estado atual das coisas.


Boa parte da falência intelectual que avança sobre algumas áreas das humanas se deve ao movimento chamado pós-modernismo. Isso não significa que todas as áreas das humanas estão sob efeito dessa podridão, pois isso é falso. A própria distinção entre "humanas" e "exatas" soa um tanto artificial se há por trás um projeto comum de busca pela verdade. Ocorre que é justamente esse projeto o que é atacado pelos pós-modernos. E de quebra, são as áreas tradicionalmente das humanas as mais vulneráveis. A filósofa Susan Haack chama o movimento de o "Novo Cinismo" (em uma atualização em relação ao velho cinismo, quando a humanidade vivia numa época de escuridão intelectual e perseguição ao livre pensamento).
Os novos cínicos defendem que tudo gira em torno dos interesses políticos e que em última análise o que conta é a força política (ou a força bruta) e não a discussão racional e a troca de argumentos. A partir disso tudo paralisa, de tal modo que a ciência, a sociedade e a política são determinadas por forças cegas e movimentos irracionais.
Alguns departamentos de humanas não só falharam em resistir ao pós-modernismo (já que sua linguagem é sedutora ao abraçar uma agenda que fala em defesa dos oprimidos e contra o capitalismo), mas parecem que o ampliaram.
E sobre o estado atual das coisas, eis um resumo de uma opinião pessoal. Há anos eu vinha acompanhando a paixão de alguns acadêmicos de humanas pelo pós-modernismo. Hoje, muitos deles ficam horrorizados de como pode ser possível pessoas darem tanta atenção a um astrólogo que se diz filósofo, outros tanto defendem coisas como a Terra plana e, pior ainda, o movimento antivacina parece estar se alastrando. A minha provocação é a seguinte: Se aquilo que você é tão apaixonado tem por trás a espinha dorsal a crença de que a verdade objetiva é um mito à serviço dos opressores, então o que você está fazendo é justamente dando munição para que aqueles que não gostam de suas atividades possam usar de armas semelhantes para atacá-lo: Ataca-se a educação, cortam-se suas verbas!
Eu me oponho ferrenhamente às motivações pós-modernas, pois são falsas e destrutivas. E também me oponho ao ataque à educação que o atual governo tem realizado, pois é infantil e hostil. Mas o estado atual das coisas é este. É lamentável em vários lados.
(Segue abaixo alguns trechos do livro do filósofo canadense Stephen R. C. Hicks. O primeiro capítulo é excelente para começar a entender o estrago intelectual do pós-modernismo).
___________
Hoje em dia, é corrente a ideia de que ingressamos em uma nova era intelectual. Somos pós-modernos agora. Os intelectuais mais proeminentes afirmam que o Modernismo morreu e que estamos à beira de uma época revolucionária — livre dos cerceamentos opressivos do passado, mas, ao mesmo tempo, inquieta, em razão de suas expectativas para o futuro.
Michel Foucault identificou os alvos principais: “Todas as minhas análises se opõem à ideia de que existem necessidades necessidades universais na existência humana”. Essas necessidades devem ser abolidas, pois são fardos do passado: “Não faz sentido falar em nome da Razão, da Verdade ou do Conhecimento — e nem mesmo contra eles”.
Se não há mundo nem ser que, em si mesmo, possamos compreender e corrigir, então qual é o propósito do pensamento ou da ação? Tendo desconstruído a razão, a verdade e a ideia de que existe uma correspondência entre pensamento e realidade, e então, finalmente, as descartado (“a razão”, escreve Foucault, “é a derradeira linguagem da loucura”), nada resta para nortear ou cercear nossos pensamentos e sentimentos. Assim sendo, podemos fazer ou dizer o que bem entendermos. A desconstrução, diz Stanley Fish em alegre confissão, “me libera da obrigação de ser correto… e exige apenas que eu seja interessante”.
Muitos pós-modernistas, porém, demonstram mais pendor para o ativismo político que para o jogo estético. Muitos desconstroem a razão, a verdade e a realidade por acreditarem que, em nome da razão, da verdade e da realidade, a civilização ocidental espalhou a dominação, a opressão e a destruição. “A razão e o poder são uma coisa só”, declara Jean-François Lyotard. Ambos levam a “prisões, proibições, processo de seleção, bem público”, dos quais são sinônimos.
O conflito entre homens e mulheres é brutal. Escreve Andrea Dworkin: “A transa normal por um homem normal é considerada um ato de invasão e de posse, realizado como uma forma de predação”.
O Pós-modernismo repudia todos os fundamentos do Iluminismo. Afirma que as premissas modernistas do Iluminismo eram, desde o início, insustentáveis e que hoje suas manifestações culturais perderam completamente a força. Embora o mundo moderno continue a falar em razão, liberdade e progresso, suas patologias indicam uma outra coisa. A crítica dos pós-modernistas a essas patologias se apresenta como o réquiem do Modernismo: “Os estratos mais profundos da cultura ocidental” foram expostos, argumenta Foucault, e “mais uma vez se movem sob nossos pés. Os pós-modernistas repelem a razão e o individualismo sobre os quais se apoia todo o universo iluminista. E finalizam atacando todas as consequências da filosofia iluminista, desde o capitalismo e as formas liberais de governo até a ciência e a tecnologia. Os fundamentos do Pós-modernismo são antagônicos aos do Modernismo. Em vez da realidade natural, o antirrealismo. Em vez de apreciarem as realizações da ciência e da tecnologia, nutrem acerca delas uma suspeita que tende à franca hostilidade.
A crítica literária pós-moderna rejeita a noção de que os textos literários têm interpretações e significados verdadeiros. Qualquer pretensão de objetividade e verdade pode ser desconstruída.
Na Educação, o Pós-modernismo rejeita a noção de que o propósito da educação é, antes de tudo, treinar a capacidade cognitiva da criança para o raciocínio, a fim de produzir um
adulto capaz de funcionar com independência no mundo. Seus representantes mais vociferantes contam-nos que “Verdade” é um mito. “Razão” é um construto eurocêntrico, de homens brancos. “Igualdade” é um artifício para mascarar a opressão.
Os debates pós-modernos exibem, assim, uma natureza paradoxal. Todos professam, por um lado, os temas abstratos do relativismo e do igualitarismo. Esses temas assumem formas éticas e epistemológicas. A objetividade é um mito; não existe Verdade, nenhuma Maneira Certa de interpretar a natureza ou um texto. Todas as interpretações são igualmente válidas. Os valores são produtos socialmente subjetivos. Culturalmente falando, portanto, não há valores, em nenhum grupo, que mereçam crédito especial.

Um equívoco (comum) sobre igualdade. O caso Neymar e Marta.

A fixação por "igualdade" já tem passado do limite do bom senso. Como já tem acontecido com vários outros mantras da lacração, o termo agora é utilizado com suficiente esticamento para perder de vista sua esfera de significado. Igualdade deveria ser um engajamento ético em prover iguais condições de acesso e oportunidades. Na acepção de muitos, a "igualdade" agora é vista como uma tentativa de engenharia social rumo a uma ideal de paridade numérica, e que enxerga discriminação em toda e qualquer eventual desproporção dos resultados. Dito isso, não é de se estranhar essa comoção por diferenças salariais entre homens e mulheres, sobretudo no futebol.
O que está em causa aqui é uma confusão entre igualdade de oportunidade e igualdade de resultados. Que todos os indivíduos devem ter acesso igualitário, garantidos por lei, a oportunidades que emergem espontaneamente em seus espíritos, sem que sejam discriminados por arbitrariedades contingentes (etinia, raça, sexo, etc.) é algo que qualquer ser humano deveria estar comprometido - aliás, é a motivação básica da cartilha dos Direitos Humanos. Disso não se segue, entretanto, que a igualdade material e/ou de resultados seja um imperativo moral. Duas razão em defesa disso são: i) Pessoas são diferentes, têm motivações distintas, logo terão aptidões diversas. Dito de outro modo, só teria sentido em se falar de igualdade de resultados se as pessoas tivessem interesse igualmente distribuídos tomando como variável principal as vontades individuais. Como a consequente não é verdadeira, a antecedente se desfaz perante a realidade; e ii) há um conflito óbvio entre igualdade de resultado e liberdade individual, ou seja, ao insistir demasiadamente na primeira é possível que se termine sem as duas (vide as insistências das experiências socialistas em criar um "novo homem", acabando por tentar igualar todo mundo, mas num nível de miséria e com pouca liberdade - a única exceção sempre foi aos intelectuais planificadores da economia e dos costumes, não por acaso membros efetivos do partido e/ou da corte autoritária/ditatorial).
 
Um fato basilar em economia é que não existe "o real valor" de uma profissão. O valor de um bem ou serviço é determinado por um complexo arranjo de fatores, tais como oferta, demanda; o que se faz impossível determinar objetivamente o valor de um serviço.

Não por acaso que jogadores de futebol e artistas ganham mais que professores. O que determina a remuneração no mercado não é se a profissão é bela, mas sim pelo valor subjetivo, ou seja, o quanto as pessoas estão dispostas a pagar. Além disso, há a questão do alcance. Um professor universitário, muito embora desempenhe uma profissão de mérito socialmente reconhecida, tem alcance muito menor em comparação a um artista ou jogador de futebol. Faça as estimativas: Um professor deve contribuir, em média, para a formação de 200 alunos ao ano; por outro lado, milhões de pessoas consomem voluntariamente os serviços de jogadores e artistas. Se não gerassem valor, seria simplesmente impossível terem esses salários.

Muita gente está assombrada pela diferença salarial de Neymar e Marta. Primeiro, é necessário dizer que o salário da jogadora já é bastante alto comparado a média de outras profissões de baixo alcance. Somado com os patrocínios, estima-se um salário anual acima de 1 milhão de reais, o que é maior do que muitos jogadores homens. Muito disso ocorre pelas razões apontadas acima. Segundo, é verdade que Neymar ganha mais, mas não é necessariamente verdade que isso se deva apenas ao preconceito de gênero. E é muito menos plausível que esse fetiche por "equiparação salarial" faça sentido econômico.

Agora, se alguém está genuinamente preocupado com isso pode fazer duas coisas: i) Ajude o salário do Neymar diminuir, deixando de acompanhar seus jogos. Enquanto você dá audiência, a emissora cobra mais dos patrocinadores e ganha mais dinheiro. Assim, os produtos relacionados valorizam, bem como aumentam as vendas de ingressos. ii) Acompanhe com mais frequência o futebol feminino e compre seus produtos derivados (exemplo, camisas da jogadora). Fazendo isso, pelas mesmas razões descritas em i), os salários médios das jogadoras devem naturalmente aumentar.

O que você não pode fazer é pensar que todas as pessoas vão começar a se interessar por futebol feminino só porque elas têm um suposto dever de dar mais empatia para a causa. É sempre bom lembrar que as pessoas são livres para gostarem e investirem seu tempo no que quiser. De fato, ninguém está impedido de acompanhar mais o futebol feminino, se assim desejar. De minha parte, eu não curto nem o futebol masculino nem o feminino, e confesso que acho o segundo ainda mais chato que o primeiro.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Sobre a liberdade

Eu adoraria viver em um planeta livre de preconceitos contra gays, lésbicas, negros, transexuais e mulheres. Igualmente adoraria não viver num planeta em que os novos cardápios preconceituosos estão se tornando mais populares e aceitáveis, entre eles o ódio e discriminação negativa contra pessoas brancas (vide exemplos norte-americanos com a famigerada tese da "supremacia branca") e pessoas héteros (sobre isso, leiam David Banatar em The second Sexism e Daphe Patai em Heterophobia).
 



















Por ora vou desconsiderar o problema de definir com mais precisão o que entendo por preconceito (para o que tenho em mente basta considerar algo como um juízo de valor moralmente equivocado sobre alguém ou grupo de pessoas). Isso pode ser importante de ser clarificado, sobretudo porque pessoas poderão divergir em relação ao que é preconceituoso caso não tenham claramente definido os termos. De qualquer forma, devo apenas destacar que não incluo casos de estereótipos como necessariamente preconceituosos. Há uma vasta literatura na psicologia afirmando que os estereótipos que temos são muito precisos (extensivamente defendido nos textos do psicólogo Lee Jussim). Um exemplo: Homens e mulheres diferem, em média, em interesses e comportamentos (ver Why Gender Matters do Leonard Sax e Diferença essencial do Simon Baron-Cohen). Isso é um estereótipomuito preciso e não considero preconceito afirmá-lo.


 De todo modo, há uma inescapável questão factual sobre o meu desejo: Pessoas preconceituosas sempre existiram, ainda continuam existindo e, embora parece que estão diminuindo (sobre isso leiam Steven Pinker em o Novo Iluminismo), não parece que se extinguirão por completo em qualquer escala de tempo razoavelmente humana (quero dizer com isso a escala de tempo antes que sejamos extinguidos como espécie). Nesse sentido, alguns sugerem o uso da empatia para combater discriminação. Acontece que a empatia é um dos recursos mais fomentadores de criar violência que existe. Funciona muito bem como aqueles que já gostamos, e muito mal com aqueles que não fazem parte do nosso grupo (sobre isso, leia Against Empathy do Paul Bloom). Por essas e outras penso que as políticas baseadas com foco excessivo em identidades de grupo estão indo de mal a pior (sobre isso, o cientista político com viés da esquerda americana Mark Lilla tem muito a dizer em O progressista de ontem e o do amanhã).



No entanto, o que podemos garantir alcançar numa escala de tempo razoavelmente humana é culpar e punir os criminosos que fazem algum dano às vítimas. Grosso modo, podemos fazer isso atacando as três principais manifestações preconceituosas mais comuns, ou seja: Punindo os agressores físicos, os agressores verbais, ou ambos. Algumas pessoas defendem que as três maneiras são justificadas. De minha parte, salvo raras exceções, só estou disposto a aderir ao enfrentamento (via leis) das agressões físicas. Eu entendo que muita gente fica desconfortável com isso, mas essa posição parece-me a consequência (defensável) que se segue em conceder liberdade de expressão isenta de menor restrições possíveis (e elas existem, sobre isso leiam Nigel Warburton e o seu Free Speech - A Very Short Introduction). E defender a liberdade de expressão só tem sentido se a defendemos para as coisas que mais desprezemos, do contrário não é liberdade coisa alguma (sobre isso, leia o caso do esquerdista Noam Chomsky que defendeu um nazista o seu direito de se expressar e Stuart Mill no maravilho livro Sobre a Liberdade).
A razão anterior é filosófica, mas há outras de teor pragmático. Se optarmos por calar a boca de nossos desafetos (inclusive os declarados preconceituosos), ou seja, aderir as três punições anteriores, o que pode se seguir disso? Vou dar três exemplos. Primeiro, o mais óbvio, é que nenhuma ideia desaparece da mente de pessoas só porque a forçamos por lei que não seja dita. Se alguma ideia ruim aparece no debate público precisamos nos esforçar para mostrar seus erros, e só podemos fazer isso com a livre expressão assegurada. Outra, nem tão óbvia, mas que parece-me ter suporte na psicologia, é que impedir ideias circular incentiva pessoas a formar grupos clandestinos rodeados em torno de suas ideias. Espere alguns anos de repressão contra essas pessoas e logo elas aparecerão com um imenso ressentimento e ódio exponencialmente maior. A partir daí qualquer tentativa de convencê-las com a palavra já pode ser uma vã tentativa. A última, eu confesso, é a mais pessoal. De minha parte eu prefiro saber o que pensam as pessoas com as quais eu convivo ao invés de impedi-las de falar. Se algo que elas acreditam me parece condenável, eu tenho duas opções: Posso conversar com elas (já fiz, e funcionou), ou posso me afastar (também já fiz, e quase nunca falha, pelo menos para minha saúde mental).

Reconheço que tem muita gente de boa intenção que trabalha com muito afinco para resolver os preconceitos no mundo. Muito do que já foi feito ajudou bastante ao progresso humano (de novo, sobre isso leia o Novo Iluminismo do Pinker). No entanto, daquilo que ainda sobra para resolver, sou bastante cético que algumas opções que estão aí com bastante popularidade (lei contra discurso de ódio, por exemplo) possam ser eficazes em não criar problemas piores do que já enfrentamos hoje. E mais uma coisa deve ser dita: Para as minorias, nunca houve momento histórico melhor para se viver neste planeta. E reconhecer este fato já alivia um pouco minha vontade utópica descrita no início deste texto.

Olavo de Carvalho: O Imbecil Coletivo

Decidi fazer um pouco o que poucos fazem. Fui ler um dos desacordos intelectuais meus, o Olavo de Carvalho. Li bastante do famoso O Imbecil Coletivo. Para quem não sabe, o livro é uma coleção de texto sobre vários assuntos de cultura e política. Selecionei aqui três erros e dois acertos. Não ofereço nenhuma grande razão para essa desproporção aos erros a não ser pelo fato que assim o quis ou porque é mais fácil detectar erros do que os acertos. Naturalmente que nem todos vão concordar com aquilo que considero um acerto, ou erro. Mas fazer o que, é a vida.
# Os três erros
"A confusão proposital começa nos termos mesmos em que se coloca a discussão: opções sexuais. Hétero e homossexualidade não são igualmente opções. As relações entre sexos diferentes não são uma opção livre, mas uma necessidade natural para todas as espécies animais. Já o homossexualismo não é uma necessidade de maneira alguma, mas apenas um desejo. A supressão total da homossexualidade produziria muita insatisfação em certas pessoas; a da heterossexualidade traria a extinção da espécie. Colocar essas duas orientações num mesmo plano, tratando-as como simples opções livres, é falsear na base a discussão. O homossexualismo é uma opção; a heterossexualidade é um dado."
Comentário: O livro foi escrito na década de 90. Pergunto-me se o autor já não teria atualizado sua lista de leitura. Não pode ser possível que na beirada de 2020 alguém ainda pensar que homossexualismo/homosexualdiade é uma opção. Isso já é amplamente falsificado na literatura, passando por evidências genéticas, neurológicas e hormonais: Ninguém escolhe ser hétero, tão pouco ser gay. Mas retornemos a realidade, pois na verdade há dois grandes grupos que compartilham parte dessa crença do Olavo: Os religiosos ortodoxos e os novos crentes das teorias de gêneros.
"A rejeição categórica do direito ao aborto decorre de evidências cristalinas, que só uma mentalidade torpe pode negar. Mas o mal não está nas mulheres que abortam, enganadas pelo desespero. Está no defensor do aborto, que com fala mansa pretende induzi-las a tornar-se homicidas. Caso elas aceitem a proposta, das duas, uma: ou estarão criando ainda mais um motivo de culpa, sofrimento e desespero, ou então terão de sufocar no seu coração todo sentimento de culpa, tornando-se frias e desumanas como seu pérfido conselheiro."
Comentário: Aqui o senhor Olavo mostra sua mediocridade enquanto autointitulado filósofo. Ao menos nesse texto, o sujeito não consegue seguir uma linha minimamente argumentativa em favor de sua opinião. Só o que rola é xingamento e ressentimento com toque de apelo à emoção. Carl Sagan, junto com sua mulher, que nem filósofos eram, articularam uma das defesas mais acessíveis sobre o aborto que alguém já escreveu. Só mencionei isso para ficar a dica de leitura mesmo.
"A liberalização do comércio de maconha liquidaria o tráfico ilegal, sim, mas por meio da mais gigantesca operação de lavagem de dinheiro já realizada em toda a História. Não sendo mais crime, o tráfico não poderia ser punido retroativamente, e as grandes quadrilhas internacionais entrariam num negócio legal em condições de privilégio monopolístico: já possuindo as fontes de matéria prima, o know how especializado, a aparelhagem de processamento, as redes de distribuição e a organização contábil e administrativa, dominariam instantaneamente o mercado, sendo inconcebível que os concorrentes novatos tivessem aí a menor chance."
Comentário: Nesse texto o Olavo se esforça para defender algo com mais conteúdo. Minha discordância é que ele despreza duas questões importantes: As evidências empíricas mostrando dano relativo baixo da maconha em comparação a outras drogas e não mostrando evidências a favor de sua defesa.
# Os dois acertos
"Na edição de 14 de setembro do Estadinho, suplemento infantil de O Estado de S. Paulo, Eduardo Martins, autor do Manual de Redação e Estilo desse jornal, toma a iniciativa de doutrinar as crianças contra o uso de expressões como “a situação está preta”, “negra infelicidade”, “destino negro”, etc., que a seu ver são racistas.
O uso de crianças como “agentes de transformação social” é um expediente desonesto do Estado modernizador e dos intelectuais ativistas para fazer com que as novas crenças que desejam inocular na sociedade, transportadas por pequenos inocentes úteis, possam penetrar no senso comum (no sentido gramsciano do termo) sem passarem pelo filtro da discussão consciente. Esse expediente, inventado pelos Estados totalitários, foi depois imitado pelas democracias e hoje se tornou prática corriqueira, que já nem escandaliza mais uma opinião pública extenuada pelos estupros repetidos.
No caso, porém, esse ardil torna-se ainda mais perverso porque é empregado para disseminar um hábito lesivo à inteligência: para reprimir, sob pretextos políticos de ocasião, o uso de metáforas naturais que remontam às origens da espécie humana e que se tornaram, ao longo dos milênios, fundamentos indispensáveis da nossa percepção do mundo. O simbolismo do claro e do escuro vem do tempo das cavernas, das sensações primevas de terror e deslumbramento. O negro do destino negro não é o marrom da pele dos nossos irmãos, mas a escuridão da noite. É a pura e simples ausência de luz."
Comentário: Não pude discordar nem um pouco dessas passagens. O namoro pelo controle do que pode ou não ser dito (por vezes quase paranoico) que alguns setores têm manifestado é nada mais nada menos do que assustador. O que me faz pensar que não é só pelos erros do Olavo que ele conquista a parcela da direita escabrosa do Brasil, mas é pelos seus eventuais acertos também. Pelo menos aqui ele está correto.
"Assim, por exemplo, nossos educadores julgam muito natural impingir aos jovens a leitura de Joaquim Manoel de Macedo, de Bernardo Guimarães e de toda uma plêiade de autores de segunda ou terceira ordem, por serem tipicamente nacionais, ou típicos da formação histórica nacional, ao mesmo tempo em que se omite da educação literária qualquer menção a escritores de valor muito mais alto, como Da Costa e Silva, por ser muito grego, José Geraldo Vieira, por ser excessivamente português, ou Hilda Hilst, por não ter raízes em nenhum lugar conhecido no sistema solar."
Comentário: Bem, confesso que não conhecia Hilda Hilst. Então devo agradecer Olavo de Carvalho por isso. O pouco que andei lendo gostei. Nem tudo são trevas desse homem.
# Comentário final
Definitivamente, você não precisa ler Olavo de Carvalho para saber tudo aquilo que precisa saber para não ser um idiota. Ele tem aqui e acolá algumas coisas interessantes a serem ditas, ao menos nesse livro. Mas na maior parte ele me é desinteressante. O que eu espero de filosofia, e o que eu costumo ler, é infinitamente superior a isso. Eu li porque sou curioso, e tenho uma certa dificuldade de não descansar enquanto não dou conta de matar a fome da curiosidade.
Outra coisa a se dizer é que nada do que ele disse está contido apenas nos texto dele. Eu aprendi poucas coisas novas até então, a não ser coisas pontuais como a sugestão da Hist que mencionei. Alguns dos temas que ele aborda você encontra em autores muito mais competentes e menos carregados de palavrões. Olavo de Carvalho diz que este livro é parte de uma trilogia, e recomenda fortemente ler os demais livros. Bem, eu não pretendo fazer isso. Minha curiosidade, ao menos por enquanto, já está sanada. Ademais, o homem ainda não está isento de bizarrices escritas por aí, recheada de teoria de conspirações e outros conservadorismos de costumes que não subscrevo (mas que devemos a ele o direito de pronunciá-las). De maneira geral eu diria que o Olavo sofre de um problema que vários outros guias de culto sofrem: Muitas pessoas que o cercam são mais olavetes que o próprio Olavo. Nada de novo nisso. Tem uma penca de gente aí que é mais foucaultiano que o próprio Foucault, que é mais freudiano que o próprio Freud, e por aí vai.

terça-feira, 1 de janeiro de 2019

Os melhores filmes que eu vi em 2018

Seguindo a tradição anual (2013, 2014, 2015, 2016, 2017), divulgo aqui minha lista de todos os filmes vistos. Foram 127 filmes vistos. Lembrando que a lista dos melhores apenas incluem os filmes lançados em circuito nacional ao grande público ou festivais no de 2018.




 
10. Pela Janela (Caroline Leone, Brasil, 2017)
Rejeição, dor e uma viagem intimista. O melhor do filme é a protagonista interpretada pela Magali Biff.













9. Nasce uma estrela (Bradley Cooper, EUA, 2018)

De todos os filmes desta lista, talvez o único que não tenha sido acometido pela má sorte ou da má distribuição e/ou desconhecimento e/ou desinteresse do público. Bradley Cooper acertou em cheio na condução da pop Lady gaga.









8. Roma (Alfonso Cuarón, México, 2018)
Cuarón arriscou com uma produção pessoal, que felizmente foi lançada no Netflix. Não considero seu melhor filme (Filhos da esperança ainda mantém este lugar), mas é uma  belíssima obra.





 





 7. The Square - A Arte da Discórdia (Ruben Östlund, Alemanha, Suécia, 2017)
O sueco Östlund já havia me encantado com Força Maior. Desta vez não foi muito diferente. Uma estranheza divertidíssima.










6. O primeiro homem (Damien Chazelle, EUA, 2018)
Filmagem cirúrgica , bela e dramática. Mesmo alguns tropeços no terceiro ato não desmerece a força do filme.













5. Guerra Fria (Paweł Pawlikowski, Polônia, 2018)
Um amor impossível separado não apenas por muros, mas também por diferenças muito além dos concretos.








4. Infiltrado na Klan (Spike Lee, EUA, 2018)
Spike Lee consegue êxito em combinar seriedade com humor.













3. Em Chamas (Lee Chang-dong, Coréia do Sul, 2018)
Lee Chang-dong ainda me soa um cineasta desconhecido. Mas seu recente filme já é um convite inevitável para conhecê-lo melhor.






 



2. Paraíso Perdido (Monique Gardenberg, Brasil, 2018)
Eu entendo os vícios que o filme da Monique tem. No entanto suas virtudes são suficiente encantadores para torná-lo um dos mais saborosos do ano.







 

1. Trama Fantasma (Paul Thomas Anderson, EUA, 2017)
Um estilista de personalidade destrutiva interpretado por Daniel Day-Lewis pelas mãos de Paul Anderson (pelo amor de Zeus, não confundir com o terrível Paul W. S. Anderson). Não deu outra: Eis aqui uma distinta mostra de um filme competente.

Menções honrosas

Me chame pelo seu nome (Luca Guadagnino, 2017), As boas maneiras (Juliana Rojas e Marco Dutra, 2017), A morte de Stalin (Armando Iannucci, 2017), Jogador número 1 (Steven Spielberg, 2018), Três anúncios para um crime (Martin Macdonagh, 2017).
Os piores
Quando a expressão "filme ruim" é eufemismo de horror. Não enquanto gênero, mas enquanto falência artística. Ao menos são divertidos em algum sentido (e cinematograficamente didático em vários).

Homem-Formiga e a Vespa (Peyton Reed, 2018)
oh, god! Um horror tedioso!

Tomb Raider: A origem (Roar Uthaug, 2018)
Tomb Raider 2 ainda é um dos meus games favoritos lá dos idos da década de 90. Mas nas telas a tragédia só aumenta a cada nova produção.

Venon (Ruben Fleischer, 2018)
Um horror tedioso que veio de outro mundo. Indescritível ruindade.

Círculo de fogo -  a revolta (Steven S. DeKnight, 2018)
Pergunto-me a mesma coisa que fiz com a continuação de Independence Day: Este filme era realmente necessário? Pois se é para induzir sono prefiro meu travesseiro.

Segue a lista de todos os filmes vistos em 2018

* péssimo
** regular
*** bom
**** ótimo
***** obra-prima


Karla - Paixão Assassina ( Joel Bender, 2006) **
Histórias que só Existem Quando Lembradas (Julia Murat, 2011) ****
Três anúncios para um crime (Martin Macdonagh, 2017) ****
O estranho que nós amamos (Sofia Coppola, 2017) ***
Logan Lucky - roubo em família (Steven Soderbergh, 2017) ***
Mulheres diabólicas (Claude Chabrol, 1960) ****
O cangaceiro (Lima Barreto, 1953) ****
Já Não Me Sinto em Casa Nesse Mundo (Macon Blair, 2017) ****
Versões de um crime (Courtney Hunt, 2016) ***
O Destino de Uma Nação (Joe Wright, 2017) ***
Porque Lutamos: A Batalha da Rússia (Frank Capra, 1943) ***
Caçador de Morte  (Walter Hill, 1978) ****
The Post: A Guerra Secreta (Steven Spielberg, 2017) ***
Todo o dinheiro do mundo (Ridley Scott, 2017) ***
Columbus (Kogonada, 2017) ****
Sem Fôlego (Todd Haynes, 2017) ***
John Wick: De volta ao jogo (Chad Stahelski e David Leitch, 2014) ***
John Wick: Um novo dia para matar (Chad Stahelski, 2017) ***
A forma da água (Guillermo del Toro, 2017) ***
Super Dark Times (Kevin Phillips, 2017) ***
O bebê de Rosemary (Roman Polanski, 1968) *****
Amantes (James Gray, 2008) ****
Tempo de despertar (Penny Marshall, 1990) ****
Me chame pelo seu nome (Luca Guadagnino, 2017) ****
Operação Red Sparrow (Francis Lawrence, 2017) **
A Tale of Two Sisters (Kim Jee-woon, 2009) ***
Persepolis (Marjane Satrapi/Vicent Paronnaub, 2007)  ****
Lesson of the Evil (Takashi Miike, 2012) ****
Antes Só do que Mal-Acompanhado (John Hughes, 1987) ***
Eles Não Usam Black-Tie (Leon Hirszman, 1981) ***
ABC da Greve (Leon Hirzman, 1990) ***
Pela Janela (Caroline Leone, 2017)  ****
Não me prometa nada (Eva Randolph, 2016) **
Aniquilação (Alex Garland, 2018) ***
Jogador número 1 (Steven Spielberg, 2018) ****
Depois de horas (Martin Scorsese, 1985) ****
Um lugar silencioso (John Krasinski, 2018) ***
Quadrilha maldita (Andre DeToth, 1959) ****
Vidas Secas (Nelson Pereira dos Santos, 1963) ****
Feitiço do tempo (Harold Ramis, 1993) ****
Cidade dos sonhos (David Lynch, 2001) *****
Up - altas aventuras (Peter Docter, 2009) *****
Monsieur Verdoux (Charlie Chaplin, 1947) ***
When I Saw You (Annemarie Jacir, 2012) ***
Os Vingadores: Guerra Infinita (Joe Russo, Anthony Russo, 2018) ***
A morta viva (Jacques Tourneur, 1943) ****
Os donos da noite (James Gray, 2007) ****
Lisa e o Diabo (Mario Bava, 1973) ***
Projeto Flórida (Sean Baker, 2017) ***
Aconteceu Perto da sua Casa ( Rémy Belvaux, André Bonzel, Benoît Poelvoorde, 1992) ***
Trama Fantasma ( Paul Thomas Anderson, 2017) *****
Era uma vez na América (Sergio Leone, 1984) ****
Eu, Tonya (Craig Gillespie, 2017) ***
Fuga para Odessa (James Gray, 1994) ***
Orfeu (Cacá Diegues, 1999) ***
O amante duplo (François Ozon, 2017) **
 Eraserhead (David Lynch, 1977) ****
O jovem Karl Marx (Raoul Peck, 2017) **
A Origem (Christopher Nolan, 2010) *****
A morte de Stalin (Armando Iannucci, 2017) ****
Cão Branco (Samuel Fuller, 1982) ****
Tomb Raider: A origem (Roar Uthaug, 2018) **
Hereditário ( Ari Aster, 2018) ***
Era uma vez no oeste (Sergio Leone, 1968) *****
Persepolis (Marjane Satrapi/Vicent Paronnaub, 2007)   ****
Pantera Negra (Ryan Coogler, 2018) ***
Círculo de fogo -  a revolta (Steven S. DeKnight, 2018) *
Sangue Selvagem (John Huston, 1979) ***
Rio Vermelho (Howard Hawks, 1948) ****
In the loop (Armando Iannucci, 2009) ***
As boas maneiras (Juliana Rojas e Marco Dutra, 2017) ****
Homem-Formiga e a Vespa (Peyton Reed, 2018) **
Sonhos Roubados (Sandra Werneck, 2010) **
Como era gostoso o meu francês (Nelson Pereira dos Santos, 1971) ***
Crepúsculo dos Deuses (Billy Wilder, 1950) *****
Missão: Impossível - Efeito Fallout (Christopher McQuarrie, 2018) ***
Paraíso Perdido (Monique Gardenberg, 2018) *****
Sandra Chamando (João Cândido Zaccharias, 2018) ***
Yojimbo - O Guarda-Costas (Akira Kurosawa, 1961) ****
Fanny e Alexander (Ingmar Bergman, 1982) *****
Quo Vadis (Mervyn LeRoy, 1951) ***
A Ilha do Milharal (George Ovashvili, 2015) ****
First They Killed My Father (Angelina Jolie. 2017) ***
Mais forte que bombas (Joachim Trier, 2015) ***
Capricórnio Um (Peter Hyams, 1977) ***
Você Nunca Esteve Realmente Aqui (Lynne Ramsay, 2017) ***
Asphalte (Samuel Benchetrit, 2015) ***
Sedução da carne (Luchino Visconti, 1955) ****
Matou a Família e foi ao Cinema (Júlio Bressane, 1969) ***
The Square - A Arte da Discórdia (Ruben Östlund , 2017) ****
O protetor (Antoine Fuqua, 2014) ***
Suspira (Dario Argento,  1977) ***
Lady Bird (Greta Gerwig, 2017) ***
O Predador (Shane Black, 2018) **
Cinzas e Diamantes (Andrzej Wajda, 1958) ***
Netto perde sua alma (Tabajara Ruas, Beto Souza, 2011) **
A morte do cervo sagrado (Yorgos Lanthimos, 2017) ***
Venon (Ruben Fleischer, 2018) *
Laura (Otto Preminger, 1944) ****
Cat People (Jacques Tourneur, 1942) ****
Cleópatra (Joseph L. Mankiewicz, 1963) ***
Nasce uma estrela (Bradley Cooper, 2018) ****
O primeiro homem (Damien Chazelle, 2018) ***
Jurassic World: Reino Ameaçado (Juan Antonio Bayona, 2018) **
Ladrão de alcova (Ernst Lubitsch, 1932) ****
Ave, César ( Ethan Coen, Joel Coen, 2016) ***
Prelúdio para matar (Dario Argento, 1975) ****
Meu Rei ( Maïwenn, 2015) ***
As três noites de Eva (Preston Sturges, 1941) ****
Bohemian Rhapsody (Bryan Singer, 2018) ***
Closer - Perto Demais (Mike Nichols, 2014) *****
Halloween  (David Gordon Green, 2018) ***
4 meses, 3 semanas e 2 dias (Cristian Mungiu, 2007) ****
Assassinato num dia de sol (Guy Hamilton, 1982) ***
A morte do senhor Lazarescu (Cristi Puiu, 2005) ***
Leviatã (Andrey Zvyagintsev, 2014) ***
Tinta Bruta (Felipe Matzembacherm Márcio Reolon, 2018) ***
Um Assunto de Mulheres (Claude Chabrol, 1988) ****
Os Exterminadores do Além Contra a Loira do Banheiro (Fabricio Bittar, 2018) ***
Hannah Arendt (Margarethe von Trotta, 2012) ***
Infiltrado na Klan (Spike Lee, 2018) ****
Roma (Alfonso Cuarón, 2018) ****
Em Chamas (Lee Chang-dong, 2018) ****
Nasce uma estrela (George Cukor, 1954) **
Guerra Fria (Paweł Pawlikowski, 2018) ****
No Coração da Escuridão (Paul Schrader, 2017) ***
 


Feminismo de virtudes

A aderência a algum tipo de feminismo está em alta. Vai desde a alguma adesão honesta e curiosa em páginas de redes sociais, passando por camisetas da Renner, tatuagens "Girl Power" e associações em coletivos. Apesar disso, o mundo atual nunca precisou tão pouco do feminismo. Disso não se segue que algumas pautas continuam sendo relevantes, como a descriminalização do aborto e uma maior atenção a profissão da prostituição (diga-se de passagem, esta última sequer é um consenso entre as pessoas feministas).
O fato é que grande parte dos problemas dos direitos relativo às mulheres já foram sanados nas sociedades ocidentais. Do ponto de vista legal, dois são dignos de nota: O direito ao voto e a liberdade ao trabalho fora de casa. Do mesmo modo, no âmbito da consciência coletiva também houve avanços reais: Demorou, é verdade, mas em tempos atuais é um compartilhamento coletivo a crença que pessoas que pensam coisas como "lugar de mulher é na cozinha" está fadado a cair no deboche, com razão, do estereótipo do sujeito que mais parece um fóssil vivo.
Por outro lado, boa parcela do feminismo atual parece estar comprometido com um desserviço à sua memória histórica. Posturas que beiram à infantilidade como "lugar de fala" e "todo homem é um estuprador em potencial" parecem cada vez mais estar ganhando espaço nos coletivos. Dificilmente alguma ganha do lesbianismo político, isto é, a crença que o homem é um mal no mundo e portanto as mulheres têm o dever de se relacionar sexualmente apenas com mulheres. Verdade seja dita, felizmente este último parece ser menos comum.
Nem mesmo alguns temas aparentemente mais dignos das pautas feministas têm sido facilmente digeridos. Sobre a questão das diferenças salariais, por exemplo, há um corpo de evidências mostrando que quando se consideram certas variáveis, como a ocupação, a posição, a formação profissional, as horas trabalhadas por semana etc., a diferença salarial entre eles desaparece. Querem saber mais sobre isso? Leiam Thomas Sowell e Warren Farrell ou a autodeclarada feminista Christina Hoff Sommers. Notem, entretanto, que raramente se discute estes autores em coletivos feministas. A ideologia cega parece estar à frente da busca desapaixonada pela verdade.
Outra atitude viciada é o constante policiamento com linchamento aos pensamentos divergentes. Eu acredito que o sexismo é um mal que vale a pena combater, mas ao mesmo tempo posso e oponho-me fortemente à caça às bruxas, à supressão da fala e ao despedimento de pessoas por expressarem ideias de que não gostamos.
No estado atual das coisas, a adesão ao feminismo, ao menos a parcela ao qual eu tenho maior contato, parece-me mais um amaciante de ego e declaração de virtude do que comprometimento honesto com causas reais.