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terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Ateísmo, Deus e Ética


                                                                                            Originalmente publicado no Bule Voador


Pintura do francês Alexandre-Louis Leloir - Jacó lutando com o anjo, suplicando sua bênção


Como pessoas ateias agem moralmente se a presença de Deus é irrelevante em seu cotidiano? Antes de acusar o bom teísta de preconceito é possível mostrar-lhe que sua ideia sobre ausência de moral na ausência de Deus está equivocada.
Imagine 02 experimentos mentais, e para cada um deles duas possíveis ações:
  1. Maria é casada e frequenta uma academia. Por motivos irrelevantes aqui, considere que seu marido nunca a acompanha nesta atividade. Um homem solteiro se aproxima dela e começa um diálogo. Passados alguns dias, e outros papos, o homem a convida para sair. Ele sabe, entretanto, que Maria é casada. Ela reforça esse detalhe, e mesmo assim ele insiste.
Ação A: sentindo-se incomodada, Maria decide se afastar do homem e troca de academia.
Ação B: Maria cede e acaba traindo o marido.
  1. João está enfurecido com alguém por uma razão banal: Não conseguiu controla-se pelo simples motivo de ter recentemente conhecido uma pessoa da qual discordou dele de vários aspectos políticos atuais.
Ação A: João consegue esfriar a cabeça ao decidir dar uma volta na quadra.
Ação B: João pega numa arma e mata seu interlocutor.
Nos dois exemplos a ação A seria uma das possíveis esperadas naquilo que a maioria das pessoas considera como moralmente correto. Traição e assassinato por razões fúteis são atitudes normalmente tomadas como desprezíveis.
Faço a pergunta: Nos dois casos, por qual razão seria necessário invocar alguma entidade divina para justificar a ação A em detrimento da ação B. Mesmo assumindo que o teísta consiga parar para pensar nos mandamentos em uma situação de vulnerabilidade emotiva, não é óbvio que a crença na existência em Deus seja condição necessária para ações morais corretas. O que está em causa é o seguinte: Até pode ser o caso de em alguma medida a crença em Deus ser relevante para a tomada de ações éticas, mas não é o caso que a crença na sua inexistência (um ateu) impeça da pessoa decidir pela ação A.
Comumente se insiste que ateus são incapazes de agir moralmente. Isso parece assumir que há uma correlação positiva entre acreditar em Deus e ser uma pessoa ética, ou, nas palavras de muitos, que há uma correlação positiva entre ser um ateu e ser infeliz e imoral. Se isso fosse verdade os países escandinavos (como Suécia, Dinamarca e Finlândia que possuem um número expressivo de pessoas declaradas ateias) estariam sempre no topo da lista dos países mais violentos e mais infelizes. O que se vê é justamente o contrário. Acontece que tomar estes dados e assumir (pelo menos a priori) que pessoas ateias são mais felizes e moralmente mais virtuosas está tão equivocado como assumir que pessoas religiosas são mais propensas a serem mais felizes e mais virtuosas pela mera razão de acreditarem em um Deus. Que o ser humano é um mosaico de complexidade psicológica já deveria ser claro. O que é espantoso é a permanência da ideia  falsa que alega impossibilidade de ações morais para a pessoa ateia.
Para quem não consegue vislumbrar a possibilidade de ações morais sem a presença de Deus está desconhecendo o mínimo de um trabalho filosófico extensamente elaborado ao longo da história intelectual humana. Colocando de outra forma a pergunta do teísta: Como seria possível as ações A dos exemplos supracitados se uma pessoa “não tem Deus no coração”? Bem, existem ao menos quatro teses morais que, embora diferenciadas em detalhes, chegariam no mesmo resultado moral. Destas, só uma assume a existência de Deus. Estas éticas são: a cristã, das virtudes, a deontológica/Kantiana e a utilitarista/consequencialista. Com pouca reflexão é possível defender que as ações A são as mais corretas nestas quatro teses éticas. O que fica logo evidente é que a existência de Deus é um tanto irrelevante (mesmo que ele exista) para que pessoas possam agir moralmente.
Não estou assumindo que todas as pessoas ateias conhecem minimamente as teses morais que prescindem da existência de Deus para funcionarem. Mas estou a dizer que uma das coisas que os filósofos eticistas fazem é tentar encontrar razões que normatizam como as pessoas agem (ou deveriam agir) moralmente, mesmo que muitas vezes elas nem saibam como justificar à luz de teses morais o porquê de escolherem a ação A ao invés da B.

Por fim uma alfinetada inevitável: Paulo de Tarso é muitas vezes apontado como um misógino e homofóbico e alegava que só haveria salvação para aquele que aceitar os dogmas sobrenaturais do cristianismo. É verdade, entretanto, que há outros que dirão o diferente: O que importa são as ações, então um ateu com boas ações poderá ir para o céu. Essa defesa, entretanto, embora mais respeitável que a postura de Tarso, desemboca na mesma independência de Deus comentada acima. Você até pode ser uma pessoa melhor acreditando em Deus, mas disso não se segue que será uma pessoa ruim caso não acredite. Se ao ateu não é garantido a salvação cristã (assumindo que isso seja sequer relevante para ele), então eu diria os cristãos: Seja cético com seu Deus, no mínimo ele não gosta muito de pessoas que são curiosas e questionam a existência de uma entidade que não parece fazer muito esforço para mostrar sua existência óbvia no mundo.

segunda-feira, 28 de março de 2016

A ética cristã

Originalmente postado no blog Bule Voador


Muitos cristão professam encontrar nos ensinamentos morais de Jesus as respostas para todas as questões morais da vida modera. Desnecessário dizer, Jesus abordou pouquíssimas das preocupações morais da sociedade atual. Por exemplo, ele não disse nada diretamente sobre a moralidade ou imoralidade do aborto, a pena de morte, guerra, escravidão, contracepção, ou discriminação social ou racial. Infelizmente, não é claro o que se pode deduzir sobre estes tópicos a partir de seus ditos ou de sua conduta prática. Sua doutrina de não resistir ao mal sugere que ele seria contra todo tipo de guerra, porém seu comportamento violento contra os cambistas nos templos sugere que ele pode considerar a violência como uma causa santa justificada. Seu dito “ame seu vizinho”, que implica amar seus inimigos, sugere que ele seria contra a pena de morte, porém suas ameaças ao fogo do inferno aos pecadores sugere que às vezes ele possa considerar a morte ou outra punição violenta como apropriada. 


Jesus não faz nenhum pronunciamento explícito sobre questões morais relacionadas ao socialismo, democracia, tirania e pobreza e o que pode-se inferir a partir de algumas coisas que ele diz parece estar em conflito com outras coisas. Considere sua atitude contra a pobreza. Sua defesa de vender tudo e dar aos pobres (Lucas 18:22) pode sugerir que ele se opunha à pobreza e queria eliminá-la. Entretanto, quando uma mulher usou um unguento caro na cabeça — e assim pudendo ser vendidos e dado o dinheiro aos pobres –, ela foi repreendida por discípulos, e Jesus a defendeu dizendo que “você tem sempre os pobres com você” (Mateus 26:11). Ele também parecia defender a pobreza material afirmando que um homem rico não pode entrar no Reino dos Céus (Mateus 9:23-24) e também que os pobres são abençoados e que deles é o reino dos céus (Lucas 6:20). Em alguns casos, o silêncio de Jesus sobre a moralidade de uma prática pode só pode ser interpretada como uma aprovação tácita. Por exemplo, embora a escravidão fosse comum no tempo de Jesus, não há nenhuma evidência de que ele atacou a prática. Como Morton Smith observou (*): 

Havia inúmeros escravos do imperador e do estado romano; o Templo de Jerusalém tinha escravos; o Sumo Sacerdote possuía escravos; todos os ricos e quase todo a classe média possuíam escravos. Tanto quanto nos é dito, Jesus nunca atacou esta prática. Ele entendeu esse estado de coisas como garantida e moldou suas parábolas em conformidade. Como Jesus coloca, o principal problema para o escravo não é para se libertar, mas para ganhar elogios de seu mestre. Parece ter havido revoltas de escravos na Palestina e na Jordânia na juventude de Jesus; e um líder milagroso de uma tal revolta teria atraído um grande número de seguidores. Se Jesus tivesse denunciado a escravidão, deveríamos quase certamente deveríamos ter indícios disso. Nós não temos estes indícios, então a suposição mais provável é que ele não disse nada a respeito. 


Além disso, se Jesus tivesse sido contra a escravidão, é provável que o seus seguidores anteriores teriam seguido seus ensinos. No entanto, Paulo (1 Corínios 7:21,24) e outros escritores cristãos primitivos guiavam os cristãos para continuar a prática de escravidão. Infelizmente, a aparente prática de aprovação tácita da escravidão de Jesus é obscurecida pela versão revisada e autorizada do Novo Testamento de uma tradição grega da palavra “doulos” como “servo” Por exemplo, na Versão Revisada Padrão, Jesus diz que o servo é como seu mestre (Mateus 10:25). Uma tradução mais exata seria que um escravo é como seu mestre.
 _________

 Fonte: Trecho do capítulo Christian Ethics, do livro The Case Against Christianity, escrito por Michael Martin (*)Reirado do “Biblical Arguments for Slavery,” em Free Inquiry 7 (Spring 1987): 30.

sábado, 27 de setembro de 2014

O bem humano e a felicidade aristotélica



(A Helping Hand, de Émile Renouf)

 "A vida não é de se brincar porque em pleno dia se morre"
(Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres - Clarice Lispector)

Talvez com uma ênfase maior que os demais filósofos, Aristóteles preocupou-se em responder o que é o bem humano. Dessa forma, o grego influenciou muitos pensadores e ainda hoje é objetivo de interesse reflexivo sobre um tema caro à nossa sociedade: a felicidade humana.
Tomando um exemplo motivacional, a seguinte situação prática é proposta: Um nadador amador, mas com capacidade suficiente para reconhecer locais perigosos, presencia um indivíduo em afogamento. No caso, nosso nadador é o agente moral e salvar a pessoa é o fim desejado. Considerando sua experiência prática, ele reconhece que tem condições de ajudar a pessoa em apuros. Duas situações podem acontecer:
Agente moral (i) - No momento em que o andador chegava para socorrer, um tronco de árvore que passava no interior do rio atingiu a pessoa em afogamento; eventualmente, ela acabou morrendo.
Agente moral (ii) - O nadador conseguiu salvar com êxito o indivíduo que se afogava.

Dentro do contexto aristotélico, pode-se perguntar o seguinte: Os dois agentes morais são virtuosos? Quais dos dois é mais virtuoso? Algum dos agentes é mais feliz que o outro? Qual a relação entre felicidade e virtude?

Aristóteles reconhecia a experiência humana como ponto de partida. Afim de entender com mais detalhes o que está inserido no contexto de "vida humana" faz-se necessário explorar um pouco o que o grego entendia como vida prática. Em "Ética a Nicômaco", Aristóteles começa ressaltando que as nossas ações se dão de modo dependente uma das outras, ou seja, fazemos coisas (escolhas, buscas ou ações) que visam a algum bem. E, mais do que isso, há um bem último ao qual todas as coisas visam:

"Toda a arte e toda a investigação, e similarmente toda a ação e escolha, parecem visar um qualquer bem; de acordo com isto, declarou-se corretamente que o bem é aquilo que todas as coisas visam." (Ética a Nicômaco 1094a 1-3)

Importante destacar que para Aristóteles há uma convertibilidade entre bem e fim -- ou seja, a concepção do bem é teleológica. Dito de outro modo, para o ser humano alcançar o que é bom para ele, precisa tomar o bom como uma finalidade. Isso é particularmente relevante na ética aristotélica, pois reconhecer algo como bom não implica tomar algo para si como bom. Vale destacar, novamente, que toda escolha visa um bem. Dito isso, Aristóteles divide o bem (o fim) em instrumental e intrínseco. O primeiro caracteriza-se como algo que busco em função daquilo que posso alcançar com essa através dele (exemplo: dinheiro), e o segundo eu busco por ele mesmo, ou seja, tem valor por si (exemplo: conhecimento). Entretanto, um bem ser intrínseco não impede que também seja instrumental. Consequentemente, Aristóteles defende a existência de um fim "finalíssimo" -- aquele que nunca é desejável em vista de outros fins --, que é precisamente aquela finalidade a qual atende a dois critérios, a saber: i) completude e ii) autossuficiência. O primeiro diz respeito a coisas que mereçam ser buscadas por elas mesmas, enquanto que a segunda é aquilo que quando isolado torna a vida desejável e carente de nada. Dito dessa forma, o critério ii) segue-se necessariamente de i).
Aristóteles identifica a felicidade (“eudaimonia”) como o único bem que pode ser completo e autossuficiente. Em outras, a felicidade (embora esse termo seja um pouco problemático enquanto tradução de “eudaimonia”) é o bem supremo. Nesse contexto, a virtude é uma condição necessária, mas não suficiente no intento de atingir o bem maior.
Outro ponto de esclarecimento acerca da natureza da felicidade merece destaque. Aristóteles nega a equivalência de felicidade com dinheiro, honra e/ou prazer físico. Disso não se segue que tais elementos não são importantes, apenas não devem ser a razão principal pela qual nossas ações são direcionadas. Dessa maneira, o que é realmente bom para o ser humano é determinado por aquilo que os seres humanos são por natureza (Shields, C.). Um bom ser humano é aquele que executa bem a função humana. E essa função é estruturada na noção teleológica que Aristóteles assume.

Dizer que a felicidade é o bem mais elevado talvez pareça uma trivialidade e o que se quer é uma expressão muito mais clara do que é tal coisa. Talvez isto surja caso se identifique a função (ergon) de um ser humano. Pois tal como o bem, e o bom sucesso, de um flautista, de uma estátua e de todo o tipo de profissão — e, em geral, de seja o que for que tenha uma função e uma ação característica — parece depender da função, o mesmo parece verdade no que respeita ao ser humano, se de facto um ser humano tiver uma função.” (Ética a Nicômaco 1097b 22-1098a 4)

            De maneira sucinta, o argumento da função toma como premissa que a atividade característica dos seres humanos é o raciocínio. O objetivo é tornar mais claro o que é o bem humano. Como já dito, Aristóteles defendia uma noção teleológica, e, nesse caso, as coisas têm, em geral, uma função. Assim, o bom exercício dessa função está relacionado ao sucesso do ser do qual ela é função. Fazer algo bem é equivalente a fazer isso de acordo com a excelência própria da atividade (Lawrence, G.). Destarte, a vida humana deve ser algum tipo de vida ativa constituída de razão, pois essa é algo próprio e exclusivo ao ser humano.Vale lembrar, portanto, a definição canônica do bem humano (Ética a Nicômaco 1098a 161-17):

O bem humano é uma atividade da alma(1) que exprime a razão de um modo virtuoso.

A metafísica aristotélica defende que a virtude moral é a perfeição da parte desiderativa da alma2. Essa observação, embora relevante, pode ser melhor entendida se nos deteremos um pouco mais na virtude moral. Esta é em vista da eudaimonia – ou seja, a virtude é consequência das ações, e não o objetivo3, no sentido de que ser virtuoso é condicionada à eudaimonia. O objetivo é a eudaimonia. Assim, devemos enfatizar que ser virtuoso não é condição suficiente para ser feliz; naturalmente há fatores externos, tais como amigos, beleza, uma condição financeira satisfatória, etc. Ser virtuoso é uma prática que leva a um hábito, ou a uma capacidade de desejar ações boas. Parte disso explica a atenção de Aristóteles no educador moral. A presença deste seria uma condição facilitadora para tornar o indivíduo virtuoso.
Uma vez entendido que o bem do humano é a atividade racional segundo a virtude, é útil, nesse ponto, trazer à tona o conceito de deliberação e como este se relaciona com a felicidade. Deliberar pode ser entendida como um processo racional que considera alternativas em vista de um fim factível (realizável). Ou, ainda, deliberar é um processo racional em vista de um fim. Assim, lembremos a tese aristotélica: "Deliberamos não sobre os fins, mas apenas sobre os meios." Nesse sentido, a felicidade é a única coisa que nunca pode ser meio – ou seja, não deliberamos sobre sermos felizes (uma maneira branda de entender isso é que todos os indivíduos querem ser felizes). Entretanto, deve ficar claro que deliberamos, sim, sobre os atos que compõe a felicidade. Dessa forma, embora não entremos em detalhes, é relevante pontuar que a deliberação é consequência daquilo que Aristóteles chamava de razão prática. Mais ainda, sendo a eudaimonia aquilo o que é bom para o ser humano, aquele que melhor determina isso é o sábio prático.
A sabedoria prática seria uma espécie de guia para que o indivíduo identificasse o bem maior de maneira correta. Desse modo, a incapacidade de organizar e planejar a vida para alcançar um único fim se deve a ausência da sabedoria prática; escolher fins ruins, ou inadequados (como prazer ou dinheiro), também revela alguma deficiência dessa sabedoria. Grosso modo, o sábio prático é capaz de identificar os melhores meios que conduzem a um bom fim (deliberação).
Nas palavras de Ackrill, a virtude moral (a excelência do caráter)  é uma mediana determinada pelo padrão seguindo aquilo que o sábio prático empregaria. Essa observação fica mais clara ao recordarmos a importante tese defendida por Aristóteles: a sabedoria prática implica necessariamente virtude moral, e vice-versa. Embora já tenha sido apresentado indicativos, é relevante destacar que uma não é a mesma coisa que a outra (identidade). É nesse sentido, também, que Aristóteles enfatiza o aspecto prático da aquisição das virtudes morais. A questão é que não há como tornar-se virtuoso moral sem, ao mesmo tempo, adquirir sabedoria prática. Além disso, a sagacidade é uma condição necessária para a sabedoria prática: Ela (sagacidade) é tida como a habilidade de colocar em prática escolhas deliberadas, como: o desejo reto (o fim que é bom) e o raciocínio correto (as coisas em vista de um fim, ou seja, a prudência). Colocando de outra forma, embora a virtude moral seja distinta da prudência, ambas coexistem -- uma não existe, necessariamente, sem a outra.
Embora Aristóteles afirme que a boa ação é a melhor vida para o ser humano, também afirma que a atividade meramente contemplativa é a que se identifica melhor com a eudaimonia. Antes de abordar esse aspecto conflitante, exploraremos um pouco mais o papel da contemplação. 
Para Aristóteles, a sabedoria filosófica é a mais digna de ser buscada -- ela é o estado saudável da alma teórica (theôria). Desse modo, a virtude da alma contemplativa (sophia) é tida como o que Aristóteles indica ser a felicidade perfeita. Ainda, parece que sabedoria filosófica "produz" sabedoria filosófica, no sentido de proporcionar o seu vir a ser, ou pelo menos fornecer meios para isso acontecer. Portanto, a atividade que mais se identifica com a felicidade é contemplação. Sucintamente, algumas razões podem ser defendias nesse sentido: i) natureza do objeto, pois diz respeito a objetos eternos, duráveis e universais; ii) é a mais contínua - no sentido de que cansa menos e é a mais prazerosa; iii) é a atividade mais auto-suficiente e iv) é aquilo que há de melhor em nós (não no sentido moral).
Podemos agora explorar melhor o problema: A virtude implica sabedoria prática, e esta serve de meio instrumental para a sabedoria filosófica, e, por fim, esta gera felicidade. Tendo em vista esse raciocínio, a consequência é que os valores das ações morais significaria que são dispensáveis quando não produzem sabedoria filosófica. Outra forma de colocar o problema é com a seguinte pergunta: Como, se é possível, conciliar teórica ou conceitualmente as exigências da vida prática e da vida contemplativa? Adianto que defenderei uma tese conciliadora, e portanto será necessário revisar alguns pontos acerca da eudaimonia, vida prática e teórica. Em suma, parece que identificar esse problema não parece condizer com o projeto moral defendido por Aristóteles, no sentido de ignorar a natureza não apenas das virtudes mas também da eudaimonia.
A primeira observação necessária pode ser encontrada em Ackrill, que defende o seguinte: Ações morais visam promover ou tornar possível a contemplação -- as virtudes morais são facilitadoras para a obtenção da sabedoria prática, e, portanto, a contemplação. Disso dito, não se segue que i) não é possível ser feliz na ausência da contemplação e ii) só é possível ser feliz se o indivíduo for um sábio prático. Disso se segue que Aristóteles parece indicar que a felicidade produzida pela sabedoria filosófica difere da felicidade produzida pela sabedoria prática. Além disso, o sábio prático é aquele que delibera bem; portanto, parece pouco plausível que a felicidade fosse impedida para o sábio prático. Dito dessa forma, podemos conciliar com o que Aristóteles comenta sobre graus diferentes de felicidade: 

A segunda vida mais feliz é a que está de acordo com o outro gênero de virtude; pois as atividades deste gênero são humanas. Pois fazemos apenas coisas justas e corajosas e os outros tipos de coisas de acordo com este género de virtude em relação uns aos outros […] e todas parecem humanas.” (Ética a Nicómaco 1178a 9-14)

Conforme discutido por Shields, “a felicidade admite graus, sendo a melhor felicidade a contemplação, mas a segunda melhor felicidade, que é à mesma genuína, é o gênero de felicidade que abrange todas as formas de virtude humana, tanto intelectuais quanto morais.” Ao entendermos essa espécie de graus de felicidade, não estamos apenas mostrando elementos textuais que defendem a tese conciliadora, mas também está em causa, embora discutível,  o seguinte: Trata-se de adotar uma perspectiva de doutrina inclusiva da eudaimonia. É útil entender "fim inclusivo" de acordo como o observado por Ackrill: algum fim que combine ou inclua dois ou mais valores, atividades ou bens; ou, ainda, como um fim no qual, dentre seus diferentes componentes nenhum membro é consideravelmente mais digno de valor do que outro. Embora a tradução de eudaimonia para felicidade seja imprecisa, o que estamos colocando aqui é grosseiramente entendido que a felicidade é um estado inclusivo composto de bens independentes. Assim, é necessário abandonar a ideia restrita que identifica eudaimonia como "felicidade" ou "prazer", e sim a entender como "a melhor vida possível", onde "melhor" não sugere, necessariamente, um sentido moral estrito (Ackrill, JL). Além disso, a alegação de que existe algum fim  desejado em vista dele mesmo não pressupõe, como comenta Ackrill, que existe "um único objeto de desejo", como se o fim fosse algo "monolítico"; aliás, as referências que defendem a arte política como arquitetônica sugerem uma concepção inclusiva da eudaimonia. Destarte, não significa que a eudaimonia seja sinônimo de fim último no sentido de desejar um fim único em detrimento de outros. Resumidamente, a eudaimonia é composta por partes, ela não é dominante.
A defesa da ideia de um fim que inclua todos os demais fins desejados independentemente, ou seja, um fim inclusivo que engloba uma pluralidade de fins separados e subordinados a um fim mais elevado pode ser melhor ilustrada por um exemplo. Não parece ser insensato afirmar que podem existir vários graus de finalidades mesmo nos fins desejados por si mesmos: F1 pode ser algo buscado por si mesmo,  e assim também é F2; e considerando F1 mais final que F2, nada impede que F2 contribua como constituinte de F1. Tomando o exemplo de Ackrill: o prazer pode ser tido como intrinsecamente digno de escolha (um fim em si mesmo), sendo um elemento da Eudaimonia. Esta inclui todas as atividades intrinsecamente dignas de escolhas. É aceitável a tese de que Aristóteles aponta a eudaimonia como sendo uma atividade que visa uma harmonia entre os diversos fins humanos, ou seja, a realização e harmonização de fins primários (aqueles fins em vista dos quais todas as outras coisas são feitas) num todo coerente (Zingano, MA). Em certo sentido, é isso que significa entender o fim supremo como ser inclusivo em detrimento de dominante.
Por outro lado, poder-se-ia objetar que a ideia do bem inclusivo sofreria  problemas em afirmações como "o bem para o homem vem a ser a atividade da alma segundo a virtude, e, se existir mais de uma virtude, segundo a melhor e a mais completa" (sophia, a virtude da razão teórica). Entretanto, pode-se entender "virtude completa" o conjunto de todas as virtudes. Como defendido por Ackrill, a conclusão do argumento da função faz referência à virtude completa, e não a alguma virtude particular.
Uma consequência disso é sobre a relação da sophia com a sabedoria prática. A última não controla a primeira, mas a torna possível. Disso não segue que a única coisa possível da sabedoria prática seja promover a theôria. Em outras palavras, Aristóteles não parece estar assumindo que se determinada ação não promove a theôria, então ela não será digna de ser buscada. Ainda assim, defende que a theôria é a atividade mais digna. O que parece estar em causa é o seguinte: Devemos exercer tanto quanto possível a theôria. Assim, outras atividades podem ser exercidas quando a contemplação não pode ser exercida, pois essas outras também são dignas de serem buscadas. A felicidade, portanto, não é negada na ausência da atividade contemplativa, mas ela é, sem dúvida, uma felicidade maior quando na presença dessa atividade. De qualquer forma, parece que dever haver um compromisso entre ações virtuosas com a theôria. Além disso, a vida apenas de theôria não parece ser uma vida feliz. Enfim, o valor da contemplação não significa que esta seja o provedor de um critério único e último para a correção das ações.
Tomando tudo o que já foi dito, a tese conciliadora pode ser resumida: a sabedoria prática proporciona tempo livre para exercer a sabedoria filosófica. Mesmo que a contemplação seja a atividade mais auto-suficiente, isso não parece implicar que o filósofo é mais auto-suficiente que o virtuoso moral. Uma razão disso é que se identificarmos as condições externas para tornar possível exercer uma atividade, o filósofo é o que requer condições mínimas para isso. Em outras palavras, o filósofo precisa de menos instrumentos e pessoas que o agente moral. Do ponto de vista da eudaimonia, concluímos o seguinte: Já que não deliberamos sobre sobre os fins, mas sobre os meios, e a felicidade é a única coisa sobre a qual não deliberamos, segue-se disso que um determinado fim poderá independer de minhas ações.
Tendo em vista o exposto, é possível resumir os questinamentos no início do texto da seguinte forma: Supondo que o agente moral obteve uma deliberação correta -- ou seja, a melhor possível enquanto ser humano --, mas não atingiu o fim desejado (agente moral i), ele não será menos virtuoso caso tivesse atingindo esse mesmo fim (agente moral ii). Dito dessa forma, no contexto do projeto ético aristotélico, será mais feliz o agente moral ii.
Vale salientar, por fim, que atos virtuosos não são escolhidos porque se é filósofo, mas porque se é humano. Dessa forma, a felicidade não é negada para aquele que não contempla, muito embora, conforme já dito, a ausência da contemplação implique o que Aristóteles sugere de felicidade segunda.
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1.
A noção de alma aristotélica não é a ideia geral que se assemelha a algo como um espírito. A metafísica aristotélica fazia uma distinção entre potência e ato. E ainda, de ato primário (e potência primária) e ato secundário (e potência secundária). Exemplo: Embora eu não fale, eu tenho a possibilidade de adquirir conhecimentos da língua francesa, ou seja é uma potência primária; quando eu começo a estudar estou desenvolvendo a potência segunda; e quando estiver falando mais ou menos fluente isso se caracteriza um ato (colocar em atividade aquilo que é possível). Nesse sentido, a alma é uma potência primária: torna algo (ser vivo) que terá capacidade de realizar atos secundário (operações vitais), e que não necessariamente devem acontecer. Portanto, não é algo tangível. O conhecimento em francês também não é um objeto tangível, mas não é, por isso, algo fantasmagórico. Aristóteles reconhece que todos os seres vivos têm alma, mas supõe haver uma hierarquia entre os seres vivos, começando com as plantas, que têm apenas nutrição, passando pelos animais não-humanos, que acrescentam a percepção à nutrição, e acabando nos seres humanos, que são também racionais.

2.
Grosso modo, a alma dos seres humanos é dividida em irracional e racional. A primeira ainda é composta de uma parte vegetativa (nutrição, crescimento e reprodução) e outra desiderativa (desejos, apetites e impulsos) e a segunda composta de uma parte prática e outra teórica. As virtudes do caráter (morais) derivam da alma desiderativa e virtudes do intelecto derivam da alma racional. Há uma comunicação entre a alma desiderativa e a racional, à medida em que a parte desiderativa "dá ouvido" à razão e nela "respinga" -- mas só na parte prática que compõe a alma racional.

3.
Interessante notar que a tese normativa moral aristotélica, bem como outras, sugerem recomendações distintas dos comportamentos que de fato acontecem. No caso em questão, tem sido evidenciado que as pessoas, ao fazerem escolhas, julgam o resultado das ações não pelo seu valor absoluto mas se o resultado envolve ganhos ou perdas comparado a um ponto de referência, e que essas pessoas pesam mais as possíveis perdas do que os eventuais ganhos (para mais informações ver os artigos "Prospect Theory" e "Rational Choice and the Framing of Decisions", de Daniel Kahneman e Amos Tversky).
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Referências

Aristóteles, Ética a Nicômaco
Lawrence, G. O bem humano e a função humana.
Shields, C. Aristotle
Ackrill, J.L. Sobre a Eudaimonia
Zingano, M.A. Eudaimonia e o bem supremo em Aristóteles

sábado, 20 de setembro de 2014

Sobre a felicidade

Texto também publicado no blog da Liga Humanista Secular do Brasil (LiHS), o Bule Voador

[O sonho da felicidade, de Constance Mayer]




“Aprender a amar a solidão. Ficar mais
sozinho consigo mesmo. O problema com
os jovens é a preocupação com as turbulentas e
agressivas ações para não se sentirem sozinhos
e isso é uma coisa triste. O indivíduo deve
aprender a ser como uma criança, o que não
significa estar sozinho. Significa não se
aborrecer consigo mesmo
. O que é um indício
muito perigoso, quase uma doença.”

[Andrei Tarkovski, cineasta russo - grifo meu]
 

 
Felicidade é algo difícil de definir e caracterizar. O texto a seguir é inspirado em algumas ideias de alguns filósofos e também em manifestações artísticas (música e poesia). Refletir sobre o tema parece ser algo que todo mundo já fez em maior ou menor grau, e tentar descobrir referências de quem já se dedicou sobre o assunto pode ser uma tarefa gratificante.

Uma maneira de conceituar a felicidade é dizendo que ela é, em geral, um estado de satisfação perante à situação no mundo. Essa noção difere, por exemplo, da noção de bem-aventurança. Esta é o ideal de satisfação independente da relação do sujeito com o mundo (por isso muitas vezes atribuído a religiões), e aquela é um conceito mais mundano e dependente, ao que parece, de outras relações do mundo ao redor.

Para muitos, a felicidade é caracterizada apenas por um estado de espírito subjetivo, ou seja, exclusivamente dependente da satisfação do indivíduo. Por outro lado, essa componente, embora importante, não é a única. Christopher Shields pontua: uma concepção objetiva de felicidade sustenta que esta consiste em satisfazer alguns critérios que não são determinados pelos desejos do agente. Dito de outra forma, isso exige que uma pessoa tenha uma vida bem-sucedida e de florescimento, e estas condições nem sempre estão no domínio do agente. Sobre isso, o filósofo Robert Nozick também adiciona: se somente a felicidade subjetiva é a que importa, então viver com o cérebro constantemente conectado em uma cuba simulando um cenário de felicidade (o que ele chama de "máquina do prazer") seria condição suficiente para a vida fazer sentido; o resto tudo seria irrelevante. Resumindo, tomar a pílula que induziria o sentimento de felicidade eterna, de modo que ficássemos apenas sentados e comendo, não parece ser felicidade coisa alguma -- pelo menos objetivamente.

A defesa da felicidade objetiva recai em outro tema, ainda mais amplo, sobre o sentido da vida. Com efeito, não é tarefa primária da filosofia fornecer ingredientes normativos sobre o sentido -- muito embora ela forneça (tem fornecido) um interessante material para reflexão. É comum a defesa de que uma felicidade meramente subjetiva poderia diminuir o aspecto do valor à vida e, dessa forma, comprometendo seu sentido.

Outros dirão que felicidade é única coisa que importa. O Robert Nozick rejeita essa visão: segundo ele, é irônico que aqueles que alegam isso conseguem distorcer o sabor do que significa os momentos de felicidade (quando tudo parece maravilhoso, desde o nascer do sol até a maneira como os cachorros brincam). Uma visão dessas, portanto, restringe em muito a diversidade de momentos da vida. A felicidade é uma entre várias outras coisas que importam. Talvez seja o caso de ser a mais importante -- mas disso não se segue que é a única. Nesse sentido, propagandas do tipo “coca-cola é a felicidade” só pode ser vagamente e superficialmente verdadeiro naqueles dias de calor, para quem gosta. No resto, é uma frase medíocre. 

Felicidade impede doenças, vários acreditam. Isso é mentira! Doenças são de causas multi-variadas, como ambientais e genéticos. Colocar a culpa da eventual doença de alguém dizendo que ela não é feliz é, talvez, inverter a ordem: é muito provável que a infelicidade seja consequência, e não causa, da doença.

Muitos dirão que as vicissitudes impedem a felicidade. Em alguns casos, certamente. Ou apenas a dificultam. Em outros, vale o o conselho sábio de Sêneca: os eventos de queda na vida são aqueles que fornecem a oportunidade de reforçar o que há de melhor em nós. Aristóteles dizia algo parecido nesse sentido: felicidade é uma atividade. Não é ficar parado cotidianamente que alguém será feliz. 
Não é, portanto, fazer a escolha de Endimião: segundo o mito, lhe foi concedido por Zeus a escolher o que quisesse; e ele, considerado muito belo, escolheu dormir para sempre, pois assim poderia permanecer jovem e imortal.
 
Felicidade é coisa só (seja lá o que essa coisa for), é o que se escuta de alguns. Talvez seja mesmo. Alguns a identificam com o prazer. Isso é um erro! Lembremos novamente Aristóteles: para o grego, o prazer consiste antes no repouso do que no movimento. O prazer é, certamente, constitutivo da felicidade. Mas não é a felicidade. Ou seja, é necessário o prazer para a felicidade, mas seria um desperdício e um erro moral que fosse apenas isso. Viveríamos como ruminantes, também diria o grego. E mais: os prazeres podem atuar como um obstáculo ao pensamento, e o são proporcionalmente a quanto mais nos deleitamos a eles. Outros exemplos colocam dúvida a tese do prazer como identificação da felicidade: pode ser prazeroso vivenciar momentos do intelecto de uma criança, mas é pouco provável que alguém preferisse viver desta forma a maior parte do tempo; algumas práticas causam prazer, mas podem induzir vergonha no indivíduo. Disso tudo não se segue, enfatizo, que o prazer não deve fazer parte da vida -- defender isso seria contradizer a natureza humana. O que parece estar em causa é: algumas atividades devem ser escolhidas por elas mesmas independente do prazer que ela nos traz. 

Dinheiro é sinônimo de felicidade, dizem vários. Se o anterior era um erro, este é um erro crasso! É confundir bens intrínsecos com bens extrínsecos. Dinheiro é da segunda espécie, ou seja, o buscamos para conseguir outras coisas. Ele por ele mesmo não é um bem moral. 

Uma vez que outra aparece alguém dizendo que estar apaixonado é uma condição necessária para estar feliz. Eu diria que pode ser uma condição facilitadora. Um momento desses pode ser de grande entusiasmo, mas pode (algumas vezes) levar ao sofrimento. Nesses casos, a banda escocesa Nazareth resumiu de maneira simples e acertada: “O amor machuca, é apenas uma mentira criada para te deixar triste.” Naturalmente, isso não é uma defesa contra a paixão, pelo contrário. Vale, portanto, o conselho de Fernando Pessoa: ame, presente na saudade; ame, enfim, com grande liberdade. A ideia central aqui é: depender exclusivamente de uma paixão para estar feliz parece uma visão excessivamente restrita frente ao que o mundo pode oferecer.
Para outros, conhecimento é proporcional a infelicidade. Um exemplo ilustrativo já mostra algo distorcido dessa ideia: é desanimador saber da existência da corrupção, mas é melhor que saibamos e consigamos propor alternativas de extingui-la o máximo possível do que não saber absolutamente nada sobre. Ou, nas palavras do filósofo de John Stuat Mill: "Melhor ser um Sócrates insatisfeito do que um tolo satisfeito". Uma tese normativa aceitável é: seja um sábio e satisfeito concomitantemente. Penso, aliás, que a relação entre conhecimento e felicidade é diretamente proporcional, e não inversamente, como o senso comum defende. Ou talvez, a melhor metáfora é uma curva cheia de inflexões – assim como várias outras coisas na vida são. Haverá casos limites em que ser ignorante sobre algo -- ou apenas não não estar atualizado de algo --,  pode fazer com que a pessoa aproveite melhor (com mais qualidade) o pouco tempo que ainda lhe resta na vida. 

Alguns dizem que há algum segredo muito misterioso na felicidade. Daniel Dennett diria: "Encontre algo que seja mais importante do que você, e dedique sua vida a isso. Podemos subordinar nossos interesses genéticos para outros interesses. Nenhuma outra espécie fez algo sequer semelhante até hoje".

Alguns religiosos identificam a crença em Deus com felicidade. Acredito que seja possível, mas é muito limitada a uma visão subjetiva. Apesar disso, não parece ter nada de moralmente errado, talvez apenas seja uma postura incompleta da natureza humana. O que é moralmente equivocado é alegar que a falta de religião (ou crença em Deus) conduz a uma vida infeliz.

Ao fim e ao cabo, "somos pequenos bípedes, mas com sonhos gigantes." Mas isso são palavras da poeta Diane Ackerman (que abria alguns capítulos dos livros do Carl Sagan) descrevendo nossa limitação e inquietude humana. E daí? Outro poeta responderia: quanto mais poético, mais verdadeiro.

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Sugestão de leitura

Robert Nozick; The Examined Life
Desidério Murcho; Sísifo e o sentido da vida em Pensar outra vez: Filosofia, valor e verdade
Christopher Shields; Viver bem: a ética de Aristóteles